BASTA MANTER AS ESTRUTURAS INTERMEDIÁRIAS?
Eu temo que grande parte dos trabalhos feitos pela burocracia para os cooperados, dirigentes e funcionários não serve para eles. Os livros, os manuais, os cursos, enfim, de nada servem, a não ser para manter a academia e a burocracia dos chamados técnicos do sistema e assessores.
Acompanho, participo e observo o cooperativismo brasileiro há mais de 30 anos, como técnico, como dirigente e como cooperado. O que já se gastou em treinamentos, consultorias, material didático, comunicação e outras iniciativas tem sido uma fábula. Instituições públicas e privadas, nacionais e internacionais, já investiram somas valiosas que, em boa medida, servem, quase sempre, para manter as estruturas intermediárias, ou seja, a burocracia.
O discurso da academia e do burocrata não chega à base e não opera mudanças. O discurso é autoritário, fechado, eloquente, porém pouco operativo. O educador pernambucano Paulo Freire dizia que só há educação quando há mudança de comportamento do educador e do educando. É nesse contexto que se insere a reflexão a respeito da cognição, do conhecimento.
Esse texto, que ora escrevo e disponibilizo para o público leitor, não serve ao público para o qual trabalhamos. Primeiro, porque não chega a ele; depois, porque não lhe interessa, uma vez que os signos são outros.
O escritor marfinense, Albert Tévoédgé, autor do importante livro A Pobreza, Riqueza dos Povos, com um belo prefácio de Dom Hélder Câmara, explica bem este fenômeno. Estruturas são montadas, entidades são constituídas, plêiade de técnicos e consultores são pagos em nome dos pobres. A situação dos pobres pouco ou nada muda. Em nome dos pobres e da pobreza mantém-se um discurso desenvolvimentista que não gera mudanças e nem as mudanças interessam à burocracia porque vive da pobreza dos pobres.
Por fim, creio que não restam dúvidas de que o leitor pode iniciar uma reflexão para o fato real da ineficácia dos trabalhos (boa parte) prestados pela burocracia. Falta um aprofundamento em questões centrais no trato epistemológico do discurso. A burocracia constrói o seu trabalho e, discursivamente, objetos do discurso. O mundo percebido é elaborado como uma maneira de ser percebido pela forma discursiva. O mundo da experiência sensorial não tem uma face externa palpável. Por isso, não produzo o mundo, mas fabrico a forma de perceber este mundo. Assim, a minha percepção do mundo e a descrição que faço dele são frutos de categorização que elaboro constantemente dos objetos que me rodeiam.
Valho-me, por fim, do professor Marconi Oliveira da Silva que, na sua tese de doutorado, transformada no livro Imagem e verdade-jornalismo, linguagem e realidade, explica que a palavra representa um conceito que substitui o objeto. Os fatos sociais se enquadram, portanto, em tudo o que envolve a vida em sociedade, com suas estruturas que condicionam os contextos e ambientes onde desabrocham as instituições (igreja, cooperativa, família, escola, tribunal, legislativo, etc.) e mais que isto, como explica Marconi Oliveira, a cultura específica de cada comunidade.
Aí mora o perigo e o desafio, pois o trabalho da burocracia atreve-se a chegar até o mundo institucional, que possui estruturas capazes de se interligarem construindo uma realidade social com bastante visibilidade. E todos se dão por satisfeitos.
terça-feira, 12 de janeiro de 2010
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